Mercado de nicho: um “mato” a ser desbravado no imobiliário
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Mercado de nicho: um “mato” a ser desbravado no imobiliário

23 mar 2022
Carlos Simon
Carlos Simon
9 min
Mercado de nicho: um “mato” a ser desbravado no imobiliário

A grande maioria das imobiliárias atua num nicho de mercado, mesmo sem se atentar a isso. Afinal, geralmente o foco de atuação dessas empresas está numa cidade, num conjunto de bairros ou mesmo em um recorte socioeconômico dentro desse espaço geográfico.

Felipe Bacichette, proprietário da Santa Ilha

Nem todas as imobiliárias comunicam de forma clara essa estratégia, até para não perder eventuais clientes que fogem dessa segmentação. Porém, muitas vezes a opção por explicitar essas escolhas pode trazer benefícios, como ganhar autoridade de marca dentro daquele segmento.

Um dos grandes entusiastas do nicho no mercado imobiliário é Felipe Bacichette, proprietário da Santa Ilha, imobiliária que encontrou seu mercado em Florianópolis, mais precisamente no Sul da Ilha de Santa Catarina – local em que ele mora há vários anos, desde que deixou o Rio Grande do Sul para se fixar no Estado vizinho. 

Para Felipe, o nicho é muito mais amplo que uma mera estratégia comercial: ele deve ser o propósito da empresa

“Dos meus 50 colaboradores, 49 moram no sul da ilha. Então, quando você escolhe o nicho de forma legítima e não de forma estratégica, no fim não precisa convencer o cliente a morar lá. É o cliente que nos procura diante da nossa autenticidade. É preciso, portanto, clareza na comunicação e coerência”, conta ele, que participou do painel “Mercado de nicho: especialistas que apostaram em negócios com foco e se tornaram cases de sucesso”, ao lado de Kléber Sobrinho (Recons), Camila Raghi (Refúgios Urbanos) e Fernanda Athayde (SIS3) no ICXP 2022 – o grande evento presencial sobre o mercado imobiliário promovido pelo Imobi Report e pela CUPOLA nos dias 18 e 19 de março, em Curitiba.

Em entrevista ao Imobi Report, Felipe comenta a trajetória da Santa Ilha até consolidar-se em seu nicho e fala sobre as maneiras de evitar que as amarras da segmentação ofereçam riscos ao crescimento da empresa. Confira:

Imobi Report: Você tem uma história de início atribulada, começando do zero, vindo de outra cidade, até formar a Santa Ilha. Como foi essa trajetória do início de atuação no mercado imobiliário até encontrar o seu nicho?

Felipe Bacichette: Quando trabalhamos com nicho, tomamos uma decisão. E se você faz uma escolha, faz também uma renúncia. Então você não vai agradar a todos no primeiro momento, precisará de bastante jogo de cintura para justificar os “nãos” que terá que dar em prol do sim. 

E de fato o nicho não é um caminho pavimentado. É um caminho que muitas vezes você terá que desbravar, pois tudo é feito de forma generalista. Então quando você pretende ser específico em algo, muitas vezes será a sua própria fonte de conteúdo. 

De fato, nos meus cinco primeiros anos o faturamento andou de lado, foi muito difícil. Mas depois, os outros cinco anos justificaram a escolha feita. O percurso é esse mesmo, mas hoje somos felizes pela escolha feita lá no começo 

Imobi Report: Qual o grande benefício da especialização para uma imobiliária ou mesmo um corretor autônomo? 

Felipe Bacichette: A gente não está inventando moda. O mercado como um todo, não só o imobiliário, mas também o automotivo, o de saúde, o fitness, o financeiro, todos eles vieram caminhando para um processo de nicho, com segmentação de público, de mercado, de persona. Cada vez menos você vê marcas sendo tão generalistas, tão abrangentes. Por que? Porque o cliente está mais exigente, mais idealista, o cliente hoje tem mais informação. Muitas vezes ele chega para falar contigo com mais informação do que você tem daquele produto, porque ele conhece aquele produto, ele é daquela região, é daquele ticket, ele estuda aquilo. 

No mercado imobiliário, vemos o quanto as empresas e os profissionais são realmente dedicados a um propósito, a uma identidade, a uma comunicação, a um cliente. E temos um fato paralelo que são os novos entrantes, os gigantes do mercado imobiliário, seja MercadoLivre, OLX, Loft, QuintoAndar. A estratégia deles é volume, é quantitativa. Você não tem como ganhar, é impossível bater de frente. 

Então seu trabalho é atuar numa área de mercado em que é um pouco mais difícil atuar quando você é tão grande. É identificar primeiro algo que demande um conhecimento maior, onde alguém está disposto a pagar por isso, e identificar daí o teu mercado de atuação.

E o interessante de trabalhar com mercado de nicho é identificar as forças do negócio. Você vai imergir, fazer uma análise no teu negócio e ele muitas vezes vai revelar questões que você não consegue ver quando está fora. 

Eu sempre faço um paralelo com os açougues, que há 5 anos atrás não trabalhavam com prime ribs, com black angus, seja o que for. Quando chegaram os hipermercados e os grandes atacadistas, trazendo junto o seu açougue, o que aquele açougue convencional pensou: “vou ter que me qualificar porque o mercado ali vai trabalhar um público que não está tão apegado à mais alta qualidade do produto”. Ele está ali por conveniência.

Aí ele qualificou seu ponto de venda, qualificou o produto e aí ele começou a entender que talvez pudesse trabalhar com cortes que nunca havia trabalhado. 

E aí ele começou a trabalhar cortes novos que surgiram e que agora estão na moda e não eram utilizados no mercado. Então quando ele olhou para dentro do negócio, ele entendeu que havia muitos produtos não trabalhados, de ticket superior, para um público mais qualificado, que compra mais, com mais recorrência e que não está ali muito pelo preço, mas pela qualidade. E aí esses mercados cresceram frente ao concorrente que poderia ter matado eles. Então isso é nicho: é entender do negócio, entender as forças que ele pode apresentar, se especializar, qualificar, melhorar o ticket, melhorar habilidade e se manter relevante.

Imobi Report: Você comentou em sua palestra no ICXP sobre a necessidade de identificação entre o proprietário e o nicho escolhido. Como funciona o processo até uma imobiliária que é generalista encontrar o seu nicho?

Felipe Bacichette: Muitas vezes confunde-se a questão do nicho com uma estratégia comercial. Não tem nada a ver. Nicho é o propósito de a empresa existir. Estratégia comercial é como vou me comunicar com o meu cliente, como nossa equipe de vendas vai usar isso para conseguir mais resultado. Não é “a estratégia que este ano vamos usar”. 

Primeiro de tudo: para conseguir sustentar o nicho, aquilo tem que fazer muito sentido para você. Tem que estar muito dedicado e seguro que você se identifica com aquilo. Que para ti é natural.

Por exemplo, no meu caso: eu vendi a empresa que eu tinha lá no Rio Grande do Sul, decidi vir para esse lugar, abri mão de ficar com meus pais, com meus amigos e vim sozinho para cá porque me apaixonei pela região. Então a admiração que eu tinha pela região, os motivos que me levaram a migrar eram muito naturais para serem comunicados. É a minha vivência, onde minha filha nasceu, onde eu moro com minha esposa, onde trabalho. Então é natural que eu consiga criar uma autoridade, uma relevância, e aí transformar isso num produto. 

Se você tem amigos de alto padrão, que têm grana, se você vê o que esse grupo sente, percebe e pensa, a partir disso você fala: “Esse aqui é meu mundo, eu entendo o que tem de valor, o que é importante aqui, como essas pessoas se comunicam, como essas pessoas pesquisam. Bom, eu vou pegar isso e transformar num produto, no meu negócio”. 

Então o nicho é pegar aquilo que você gosta, a tua vocação, fazer um um protótipo, colocar isso no mercado da rodada e botar para rodar. 

Imobi Report: A especialização por território, como é o teu caso, ou por renda, são as mais comuns dentro do mercado imobiliário. Quais outras formas de segmentação também podem render frutos para a imobiliária ou o corretor autônomo? 

Felipe Bacichette: A gente tem uma segmentação que vem surgindo que é por persona. Claro que é preciso analisar a quantidade de público nessa área, mas tem sido muito mais visível. Pessoas gostam de falar com pessoas, não com marcas, elas querem ter troca, interação. 

E cada dia mais as pessoas estão no caminho de falar com quem vive as mesmas coisas: se são esportistas, fit, da saúde. Ter um nicho de personas que tenham hábitos parecidos. São os hipernichos. 

Por exemplo, há diversas novas marcas gigantescas que já fizeram seu IPO, que têm um produto para todos, mas com uma comunicação muito clara que é para algum tipo de persona, para quem tem algum propósito, de identificação. Então elas pegam aquela identificação e você comunica dizendo: “eu acredito em você”, mesmo produzindo para todos. 

Hoje isso se ramificou muito e as próprias redes sociais usam muitos dados para você poder cruzar isso. As marcas têm entrado nesse novo nicho de personas por valores, por crenças e não por produto e por valor financeiro. E isso tem sido bem legal.

Imobi Report: Estabelecer o nicho é importante para adquirir autoridade junto a determinado campo. Mas, como um nicho muito segmentado, não há um risco de limitar o crescimento da carteira e da empresa de forma geral?

Felipe Bacichette: Acredito que isso seja uma crença que estamos conseguindo derrubar com o tempo. Porque hoje a gente tem muito acesso a serviços. No passado recente, a falta de informação, de dados, de você conseguir ter precisão na comunicação fazia com que isso pudesse acontecer. 

Hoje com as ferramentas que a gente tem, o cross-selling, em que você cruza serviços, setores, departamentos, você consegue encontrar serviços que vão incrementar na receita do teu negócio. 

Dou um exemplo bem simples: lá no Sul da ilha acabamos desenvolvendo uma empresa quando entendemos que o mercado estava um pouco limitado, que ele não conseguia produzir produtos. De acordo com a nossa fome de crescimento, não pensamos em ir para o Norte, para a Lagoa, para o Centro. Tínhamos muito cliente, muito lead, mas não tínhamos produto .

Então a gente abriu um braço, uma outra empresa que se chama Brasa, que é uma empresa de fomento imobiliário. Ela identifica terrenos potenciais, desenvolve todo o projeto, toda a comunicação, faz um match entre investidores e incorporadores e naturalmente fica com exclusividade do produto, que é lançado através de um incentivo. Então, ao invés de a gente esperar o mercado lançar, estimulamos isso. E deu muito certo, hoje a gente fala que a Santa Ilha é a casa dos lançamentos porque nos últimos três anos não houve nenhum lançamento relevante que a Santa Ilha não virou como exclusivo. E aqui dentro tem muita remuneração: na negociação do terreno, na questão da campanha, existem remunerações que vão se criando quando você entende carências e participa da solução disso. 

Então há vários outros serviços que a gente incorporou nesse processo. Fomos descobrindo novas receitas que não estavam no radar. Dá trabalho, mas se você está realmente dedicado, para mim dá mais trabalho desbravar uma nova região, um novo nicho do que eu qualificar o meu.

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